sábado, 28 de janeiro de 2012

                         Elis, a estrela do Brasil

Maurilio Tadeu de Campos



“Ah, como essa coisa é tão bonita / Ser cantora, ser artista / Isso tudo é muito bom...”  (Joyce/Ana Terra)



     Sorriso nervoso de dentes pequenos, gestos de braços se agitando combinados ao canto forte. Elis chamou a atenção e imediatamente conquistou inúmeros fãs. Na era dos Festivais, ainda no tempo da TV em preto e branco, assisti a final do Festival Nacional da Música Brasileira de 1965. Elis imprimiu seu talento a uma bela canção de Edu Lobo e Vinícius de Moraes, Arrastão, que venceu o Festival. O Berimbau de Ouro foi parar nas mãos dos seus autores, que o repassaram à intérprete por merecimento. Elis projetou-se nacionalmente, porém, com a canção Menino das Laranjas de Theo de Barros e Geraldo Vandré. E mostrou a que veio: ser a melhor intérprete da música popular brasileira de todos os tempos. E foi se renovando, ampliando seu repertório, revelando novos e já conhecidos compositores, deixando a sua marca de mulher combativa e determinada. Apesar de ter vivido apenas trinta e seis anos notabilizou-se como artista e ainda hoje é referência na canção popular do Brasil e de além fronteiras. Descoberta em Porto Alegre, sua cidade natal, surgiu para a música e consolidou-se como grande cantora. Procurou trabalhar a sua voz como se fosse um instrumento, extremamente afinado, dominando graves e agudos com facilidade. Numa entrevista revelou que cantar era o que mais gostava de fazer; e isso ela fazia isso muito bem, com segurança e perfeição. O sucesso marcou a sua trajetória de artista, aplaudida e reverenciada em muitos palcos brasileiros e do exterior.

     Sempre em busca de maior esmero técnico roçou, com algum risco, períodos de interpretações mais frias, mas soube imprimir à sua carreira momentos vibrantes, intensos, como grande atriz do canto, combinando emoção à técnica de grande intérprete. Seus shows foram disputados por platéias ávidas e numerosas, como em Falso Brilhante, que teve mais de mil apresentações e ficou dois anos em cartaz. Transversal do Tempo foi outro espetáculo cuja polêmica marcou uma fase altamente politizada da cantora em anos difíceis. Saudade do Brasil, outro de seus shows em que a popularidade e a grandiosidade de Elis podiam ser observadas em suas interpretações. E o seu último, O Trem Azul, confirmou a sua versatilidade. Soube conduzir com maestria vários programas de TV, a partir de O Fino da Bossa, apresentados, todos, com talento e, acima de tudo, com carisma e precisão.

     No auge da carreira e repleta de planos saiu da vida, inesperadamente. Ficamos atônitos. Não conseguimos aceitar que, de repente, o Brasil perdia a sua melhor intérprete popular. O rádio, a TV e outros meios de comunicação voltaram-se à morte de Elis. Naquele 19 de janeiro de 1982 nada mais se ouvia a não ser o som da sua voz e as imagens das suas apresentações. As notícias expunham o que não queríamos acreditar. Choraram Marias e Clarices; chorou a nossa Pátria, mãe gentil. Hoje vemos e ouvimos Elis por meios eletrônicos, como desenhos de luz, agrupamentos de pontos, de partículas, processamentos de sinais, uma forma nebulosa feita de luz e sombra, como uma estrela. Há exatos trinta anos Elis Regina intensificou seu fulgor de estrela de primeira grandeza e jamais será esquecida. Brilhará eternamente no universo da música popular de todos os tempos.






sábado, 14 de janeiro de 2012

Presentes de Deus


Maurilio Tadeu de Campos

Tarde de domingo, ensolarada. Estava no Deck do Pescador observando o sol estender o seu rastro dourado sobre o mar, na entrada do estuário. Essa cena levou-me à fantasia de um caminhar imaginário naquele tapete estendido pelo astro rei que se despedia para retornar, admirável, no novo amanhecer. Nos rostos das pessoas percebi o prazer que a natureza proporcionava, fazendo todos se irmanarem, cúmplices da magia astral que conduzia ao êxtase completo, à paz, à felicidade. Barcos de diversos tipos e tamanhos cortavam o mar e seguiam pela esteira dourada, num vaivém frenético de quem quer ir ou chegar por esse mar tão nosso e tão próprio da nossa cidade, limite da orla sem limites para o Atlântico.

Em Santos, nos lugares em que costumamos frequentar, acabamos por encontrar pessoas conhecidas e, naturalmente, os laços de amizade vão sendo fortalecidos, mesmo que, inicialmente, nem saibamos direito as identidades dos rostos já familiares e, quase sempre sorridentes. Cada rosto passa a ter um toque conhecido e quando ficamos juntos nos sentimos bem. O pertencimento é o traço de união; estamos na mesma cidade, que escolhemos para nascer e viver, essa Santos marítima que mistura o trabalho e o lazer e nos faz muito bem. E nessas tardes quentes e ensolaradas, reencontrar amigos é inevitável. A busca pela brisa que suaviza o calor vem reger esses instantes agradáveis. Respiramos profundamente e absorvemos a maresia que está impregnada na atmosfera benfazeja; é bom desfrutar desse ar, que nos traz a energia necessária para que enfrentemos bem os dias seguintes. Nos encontros, trocamos sorrisos afetuosos, apertos de mãos, cumprimentos, atos comuns aos que se querem bem.

O verão nos oferece dias mais longos, tardes quase intermináveis em que o poente proporcionado pelo Sol é a constatação de que a porta do dia vai se fechando vagarosamente, conduzindo nossos pensamentos aos sonhos e às coisas boas realizadas ao longo da nossa vida. E cada vez que a porta de um novo dia se abre, nos sentimos preparados para continuar a nossa trajetória de cidadãos do mundo, impulsionados para novos momentos a experimentar.

E eu, ali, naquele deck, extasiado, em meio a um emaranhado de varas de pescar e de semblantes ansiosos vi surgir à minha frente uma suave nave branca, vagarosa, imponente e bela. Braços passaram a se agitar, para as despedidas. Do navio muitos acenaram e nós, ali, retribuímos, como se a desejar boa viagem. E o tapete dourado produzido pelo sol é rasgado pela proa do transatlântico que passa imperante rumo ao oceano. Um apito grave nos acautela e parece nos dizer: “Até breve, vou até ali e já volto”. Logo depois, outros navios, tão majestosos quanto o primeiro, também desfilam pela passarela dourada, espargindo esperanças e conduzindo sonhos, misturados ao lazer e ao entretenimento.

Voltei para casa com as imagens daquele fim de tarde de domingo, tão parecido com tantos outros, mas, ao mesmo tempo diferente. Os domingos jamais serão todos iguais, pois cada um nos traz a sua especial e doce individualidade, que guardamos em nossa memória com alegria e emoção. Em pensamento agradeci a Deus por ter assistido a uma sequência de performances tão singulares, presentes de valor incalculável, oferecidos de graça, numa mistura do progresso do homem e, sobretudo, da grandiosa obra de Deus.

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